artigo da semana

-O NOSSO RACIONALISMO. - ERRO DOS QUE PRETENDEM PERPETUAR A INFÂNCIA DA HUMANIDADE -

Por José Amigó e Pellícer

Uma colaboração de Estênio Negreiros (estenio.gomesnegreiros57@gmail.com)

 

 

Primeira parte

 

Capítulo III

 

Já nos parece ouvir a palavra racionalistas, lançada em tom de anátema sobre nós, que ousamos lembrar que é a razão o atributo distintivo da natureza humana — atributo que não pode o homem ter recebido da Divindade sem um fim: sem o dever de desenvolvê-lo e de servir-se dele para os atos que dependem da liberdade individual. O que seria a liberdade humana, o livre-arbítrio, sem o jogo da razão e sem a luz do entendimento? Como poderia a consciência ser responsável por suas faltas e a vontade por suas determinações, faltando ao homem o farol que esclarece a primeira e guia a segunda? E se, possuindo essa luz, o homem procura apagá-la ou cerra os olhos para não se servir dela, como procederá com liberdade? Pode ter Deus posto na substância racional algo que corte a sua atividade e a condene a um estado embrionário ou ao quietismo e à inércia, a respeito das verdades eternas, religiosas? Pode o Supremo-Arquiteto ter querido, em suas relações com a criatura, e da parte desta, a correspondência humilhante do escravo a um culto automático, sem inteligência e sentimento, ou a homenagem que nasce do reconhecimento e da admiração? Racionalistas! Se com esta palavra se pretendesse designar os que levantam em sua alma altares à razão, para divinizá-la, considerando-a como a única lei das ações humanas, repeli-la-íamos com toda a energia; pois bem compreendemos que as faculdades do homem são progressivas, conseguintemente limitadas e limitado o círculo da sua atividade e a esfera do seu poder.Tampouco somos racionalistas no sentido de negar toda a autoridade. Admitimos, de bom grado e com veneração, a autoridade que emana direta ou indiretamente de Deus e as de todos as que têm tomado a dianteira nos caminhos difíceis da Ciência, enquanto as suas afirmações se conformam com as leis do bom senso. Mas, se ser racionalista consiste em empregar prudentemente a razão, até tende chegam os raios mais ou menos intensos da nossa luz — em buscar a Deus por nós mesmos, estimando pelo seu valor a meditação alheia — em procurar irmanar e harmonizar a ciência com a religião e a religião com a ciência — em pedir a esta sanção à fé — em considerar a autoridade dos homens como autoridade falível, o que equivale a dizer: autoridade humana — em discorrer sobre o que a razão não compreende e recusar o que a razão recusa por absurdo — em investigar a maneira mais própria e agradável de servir, em espírito e verdade, ao Pai comum das criaturas — em confiar à sua paternal justiça o que possa fortificar as nossas almas no desejo e na, prática do bem — em reconhecer a nossa fraqueza, a nossa impotência, e implorar o superior auxílio em nossas dúvidas e desfalecimentos; se nisso consiste o nosso racionalismo, por que negá-lo, quando ele está na dignidade e nos atributos da natureza humana? Quão errados vão os que pretendem perpetuar a infância da Humanidade! A criança transformou-se em adulto, e busca a emancipação e a independência próprias da nova idade em que entrou. Não creem no progresso dos tempos, e o progresso dos tempos se lhes impõe. Educaram as sociedades, mas não souberam aprender que as sociedades não ficam estacionárias. Monopolizaram a Ciência, mas têm visto como irradia ela a sua luz em todas as direções, e não adivinharam que essa luz havia de espancar as trevas da fé que não se firmasse na Ciência. A História nada lhes ensinou — o véu das ciências experimentais e da filosofia nada lhes tem deixado ver — a Terra continua para eles fixa e encravada no centro do Universo — e ainda têm a aspiração de deter o curso do Sol, como Josué. Talvez oponham, aos nossos bons desejos e sinceras observações, os seus costumados anátemas. Não os tememos, porque já perderam a sua escassa importância, desde que se fizeram infalíveis; sentimos, porém, e deploramos isso, como sentimos e deploramos todos os abusos desta espécie, que se dão em nome de uma religião que recomenda a caridade como a primeira das virtudes. Se nos amaldiçoam, nós os abençoamos. São nossos irmãos, e, ás suas palavras de ódio e de maldição, responderemos com palavras de amor e de perdão.

 

Do livro Roma e o Evangelho, traduzido do original espanhol conforme os direitos concedidos à Federação Espírita Brasileira. Extraído da página https://www.luzespirita.org.br/leitura/pdf/l99.pdf

 

Fortaleza,CE, 29/12/2021.