artigo da semana
-DEVER DO HOMEM VERDADEIRAMENTE RELIGIOSO - NECESSIDADE DE UMA IMEDIATA REGENERAÇÃO RELIGIOSA-
Por José Amigó e Pellícer
Uma colaboração de Estênio Negreiros (estenio.gomesnegreiros57@gmail.com)
No estado atual das sociedades e na altura a que tem chegado o desenvolvimento do senso comum e da razão humana, não basta dizer e assegurar que tal ou qual igreja é a única depositária do fogo sagrado, e sim faz-se preciso satisfazer, com provas concludentes, as legítimas aspirações dos que baseiam a verdade no seu terreno natural — no terreno da Ciência. O Magister dixit (10) já fez seu tempo, e os menos exigentes reclamam alimentos mais substanciais para saciar sua fome intelectual. E, quando em busca da razão da fé, se tropeça num diabo, que limita o poder de Deus — com um inferno que fala contra a bondade, a misericórdia e a justiça divinas, com um purgatório que pode ser abreviado por dinheiro, etc. não é possível deixar-se de exclamar estas doutrinas são ateísticas e irracionais — e o ateu não pode, nem poderá jamais fazer parte da verdadeira religião. E qual é o dever do homem que crê em Deus e na imortalidade da alma, se persuade de que a sua religião não explica as verdadeiras relações entre a criatura e o Criador — se reconhece que a mentira está de envolta com a verdade — e o transitório e mutável confundido com o eterno e essencial? O seu dever é levantar a voz contra a impostura, não consentir em silêncio na exploração da razão e dos sentimentos do homem pelo homem, protestar contra os abusos e mistificações que se cometem, tomando-se a Divindade por editor responsável, discriminar o divino e o humano, a fim de que as obras de Deus brilhem em todo o seu esplendor, arrostar as consequências, comumente desagradáveis e funestas, que soem provir da defesa de verdades ainda não aceitas pela generalidade dos homens — em uma palavra: cooperar decididamente para que a verdade religiosa faça caminho pelas inteligências e pelos corações, sacrificando nas aras de tão santa causa o próprio bem-estar e mesmo a vida, se os acontecimentos fizerem necessário tal sacrifício. Que nos deve importar o ridículo, se, desprezando-o, levamos o nosso grão de areia para a obra da regeneração humana? Que nos deve importar o insulto, se no santuário da nossa consciência gozamos a inefável satisfação de quem faz o bem pelo bem, sem esperar recompensa dos homens? Que importam humilhações — impropérios — anátemas e perseguições, com que os defensores do erro contestam os que se atrevem a denunciá-los ante o grande tribunal da consciência universal, se, com isso, logra-se que a consciência humana se emancipe do secular domínio que corta a sua atividade e se eleve sobre as preocupações que a envolvem e obscurecem? Basta de temores indignos e de considerações egoísticas, único esteio do vacilante edifício dos absurdos religiosos. Já é chegada à hora de se restaurar e reedificar o Templo, e de se adorar a Deus em espírito e verdade. Basta de mistificações e de superstições, de comédias religiosas, de deuses pequenos, e de cultos insustentáveis, que têm desmoralizado as sociedades e desenvolvido, de um modo pavoroso, a indiferença, o cepticismo e o culto da matéria. Não vedes como o mundo moral se desmorona? Não ouvis o ruído das crenças que caem por terra? Não vos faz tremer o clamor que se levanta de todas as consciências, o frio que gela todos os corações, o simum (11) que impele e arrasta todos os povos, o fogo que abrasa todos os Estados católicos da Terra? Dirigimo-nos aos homens de boa-vontade. Sabeis por que imperam o dolo e a mentira nas relações sociais e na política dos povos? Por que os laços da família se relaxam e a imoralidade campeia em todas as esferas? Por que o egoísmo se apossa dos homens e por que o ouro é o ímã das suas ações e desejos? A causa de tantos males é a falta de crenças que sejam a sanção da moral — e, sem o regulador da moral, a perturbação se introduz nas famílias e a corrupção agita as sociedades. Os homens que aspiram à vitória da verdade são mais numerosos que os interessados, de boa ou de má-fé, na sustentação do erro. Unamo-nos, pois, juntemos os nossos caritativos esforços, porque insulados eles não dão fruto. A arca da salvação, o Evangelho de Jesus, flutua ainda sobre o oceano das misérias humanas. Não transijamos por mais tempo com a mentira religiosa, seja qual for a sua procedência — sejam quais forem os atavios com que se adorne - seja qual for à autoridade que a pregue e explore.
(10) Magister dixit ("O mestre disse"): expressão em latim utilizada para construir um argumento referindo-se a uma autoridade tida como inquestionável — N. E.
Do livro Roma e o Evangelho, traduzido do original espanhol conforme os direitos concedidos à Federação Espírita Brasileira.
(11) Simum: vento forte e frio que vem do sul em direção ao norte — N. E. 28.
Extraído da página https://www.luzespirita.org.br/leitura/pdf/l99.pdf
Fortaleza,CE, 03/02/2022.