artigo da semana
-PLURALIDADE DAS EXISTÊNCIAS DA ALMA-
Por José Amigó e Pellícer
Uma colaboração de Estênio Negreiros (estenio.gomesnegreiros57@gmail.com)
Capítulo XVII
Primeira parte
No dizer de Roma, as almas são criadas no momento de virem aos corpos, seus instrumentos de bem-aventurança ou de perdição.
Vivem depois sob o invólucro material e, emancipando-se dele pela morte, são transportadas ao infinito, para cantarem eternamente louvores a Deus ou para blasfemarem eternamente.
Analisemos estas afirmações à luz da razão. Se a alma passa, ao sopro divino, do não ser ao ser, no momento de penetrar no corpo, como se lhe assinar responsabilidade no pecado original dos nossos primeiros pais?
Por que princípio de justiça, por que impenetrável mistério se lhe imputa uma falta cometida quando ela ainda não havia sido criada?
Será, porventura, que o Supremo Criador não criou as almas, mas fê-las de uma substância contaminada em sua primeira manifestação individual?
Todos os homens, diz-se, estavam contidos no primeiro.
Como é isto? Corporal ou espiritualmente?
Na primeira hipótese há um erro evidente; pois que o organismo humano se renova, de modo que, em certo tempo, não existe nele nenhuma partícula do que foi o corpo nos primeiros dias da vida; na segunda, o próprio Catolicismo Romano estabelece que Deus cria sucessivamente as almas, o que repele a hipótese.
Supondo mesmo que houvesse no primeiro homem o princípio gerador e orgânico, que se há transmitido pela geração aos demais, não deixa de ser menos concebível a transmissão do pecado original.
O único responsável pelos atos da malícia é o eu, o ser inteligente e livre, a alma, e, portanto, o responsável pelo primeiro pecado é exclusivamente a alma, que o praticou (25), e de modo algum as que não foram presentes, nem contribuíram para que ele se desse.
Ainda mais: a mácula original, segundo afirma a igreja dos papas, foi completamente lavada pela água do batismo. O homem, recebido aquele sacramento, fica puro e imaculado, de sorte que, se naquele feliz instante desaparece do número dos viventes, a sua alma se eleva sem tropeço aos pés do seu Criador.
Ainda bem. Se o homem pelo batismo se desprende do pecado hereditário, por que novo mistério o transmite a seus filhos? Em virtude de que lei nova transpassa e lega a seus herdeiros um vício, uma lepra, uma dívida, que já tinha saldado?
E, se herdam as consequências da primeira falta, que, por ser a primeira, não deixa de ser da natureza das outras, por que não se herdam as consequências da segunda e da terceira?
Ponhamos de parte responsabilidades absurdas e inconcebíveis em justiça e estudemos o que pode significar o pecado original no terreno filosófico, já que a religião romana lhe dá uma interpretação evidentemente errônea.
Que o homem vem ao mundo com algum vício anteriormente contraído, não é lícito pôr em dúvida, e menos negá-lo. Tal fato aparece escrito, com caracteres irrecusáveis no organismo humano e em cada uma das manifestações da alma.
Os sofrimentos físicos e morais não merecidos por atos da vida presente; a miséria, os infortúnios, as enfermidades, o idiotismo, a loucura, que são, que podem ser ante a justiça de Deus, senão provas assaz claras de que o Espírito vem às lutas da vida com feridas recebidas em anteriores combates?
Que podem ser senão consequências de extravios e erros persistentes da alma? E, pois que não é possível conceder a culpa sem o culpado, preexistindo à primeira, a preexistência do segundo fica igualmente estabelecida e fora de toda a dúvida. Resumamos: O homem não é responsável por pecado em que não tomou parte pessoalmente, por sua livre vontade; logo, a teoria da Igreja Romana, quanto à transmissão do pecado original, é evidentemente errônea.
A vida é uma demonstração palmar de que o homem vem ao mundo com responsabilidades inatas; logo, a alma humana em quem se faz efetiva tal responsabilidade é preexistente à sua união com o corpo.
Resulta daí que, além da vida presente, da existência atual, o homem deve ter tido outras existências solidárias. A cada uma das quais a alma traz a responsabilidade das faltas cometidas na anterior e os efeitos de suas fraquezas e extravios; existências de provas, de reparação e de purificação, destinadas a conduzi-la, de grau em grau, à perfeição e à felicidade, por seus merecimentos e virtudes.
(25) A alma que pecar, essa morrerá: o filho não carregará com a maldade do pai, nem o pai com a do filho; a justiça do justo sobre ele será, assim como a impiedade do ímpio. (Ezequiel, 18: 20.)
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