artigo da semana
-FÉ CEGA E FÉ RACIOCINADA - CONFORMIDADE DO ESPIRITISMO COM O CRISTIANISMO - OS TORMENTOS DA DÚVIDA - O NOSSO CREDO-
Por José Amigó e Pellícer
Uma colaboração de Estênio Negreiros (estenio.gomesnegreiros57@gmail.com)
Capítulo XXI
Começamos os nossos estudos de Espiritismo com a resolução de abandonálos se, no caminho de nossas investigações teóricas-práticas, surgisse algum princípio oposto à moral evangélica, baluarte inabalável de nossas crenças religiosas.
Envoltas no tenebroso turbilhão que nasce da discordância da fé com a razão, quisemos arrancar a túnica envenenada da dúvida e procurar a paz dos corações crentes; mas isto sem sairmos dos limites do Evangelho, monumento imperecível da verdade revelada.
E qual foi o resultado, qual o fruto colhido na excursão realizada?
O presente trabalho responde claramente.
Renunciamos completamente à fé que não pôde suportar o peso da investigação — e colhemos, em compensação, profundas convicções e a confiança que inspira a certeza de se haverem encontrado os traços da verdade.
Somos fracos, somos fáceis às seduções da carne e do orgulho; porém não podemos deixar de confessar que o Espiritismo é um regulador eficaz dos costumes e poderoso incentivo a todos os bons sentimentos.
Não se opõem as doutrinas espíritas à moral pregada pelo Filho do Carpinteiro; antes vêm oferecê-la em toda a sua pureza e limpa das inovações humanas que a tem desnaturado e corrompido.
Registrando as prédicas de Jesus e dos Apóstolos, capítulo por capítulo, versículo por versículo, vimos nelas claramente sua perfeita concordância com todos os fundamentos do Espiritismo — e não menos clara discordância com grande número de dogmas do papado. Nesta alternativa, a quem devemos seguir: ao papa ou a Jesus? Aos bispos do século ou aos Apóstolos das primeiras eras?
Deveremos seguir a Roma que condenou, ou a Jesus que não veio condenar, mas salvar?(37)
A
escolha é fácil. Sem vacilação, nos acolhemos à bandeira do Cristo e, à sua
sombra, aguardaremos o cumprimento das divinas promessas: céus novos e terra
nova onde domine a justiça.(38)
Abraçados a ela, arrostaremos as provações, os insultos, as injúrias, as
ameaças, os ódios e as perseguições, pedindo, a quem nos há de julgar a todos,
tesouros de caridade e de amor para saber perdoar aos nossos inimigos.
Por que nos odiarem e nos perseguirem? Somos, porventura, responsáveis por adquirirmos convicções, pedindo a Deus luz e proteção? Erguemos, acaso, algum pendão de extermínio?
Se não quiserdes vir conosco, inspirar-vos em sentimentos cristãos, não nos persigais; pois que, se o Espiritismo é invenção humana, por si mesmo sucumbirá — e, se divina é sua origem, em vão tentareis pôr diques à corrente invasora da vontade de Deus.
Somos espíritas em Cristo, e os nossos deveres em Cristo são a prédica da verdade e a prática do amor. Em cumprimento desse dever, para nós sagrado, vamos hoje dizer a nossos irmãos que nos lerem: não ridiculizeis, não repudieis o Espiritismo sem estudá-lo; não desprezeis a nova revelação que baixa das alturas, e nela descobrireis o remédio para vossos males e para as enfermidades que corroem as entranhas da sociedade moderna. Vinde conosco, nós vos pedimos, e pedimo-lo, porque sois nossos irmãos e queremos vosso bem e vossa felicidade. Vinde, os despreocupados, que não encontrareis em nós superstições ridículas. Vinde, os católicos sinceros, que o demônio não pousa onde reinam a caridade e a adoração ao Ser Supremo. Vinde os materialistas, pois, se procurais de boa-fé as provas do vosso erro, provas tereis com que encher o vácuo em que miseravelmente vos revolveis.
Quão longos, tristes e negros, são os dias em que se apodera da alma a dúvida, e a fustigam, e a torturam com a ameaça de um futuro que se some na pavorosa confusão do nada!
Os sentimentos, a vontade, a consciência, o juízo, todas as forças vivas do espírito se sublevam, sentem horror ao vácuo, à negação, e buscam, na Terra, no espaço, no céu, onde quer que veja brilhar uma chispa luminosa, a afirmação do seu ser e da sua imortalidade.
Consulta, então, o homem a seus semelhantes; mas onde achar uma autoridade infalível? Inquire à Ciência, pergunta à Religião; porém estas se destroem; e tal confusão aumenta as dúvidas do espírito.
As noites de insônia sucedem os dias de ansiedade, a saúde se quebranta, foge a paz do coração, e perde-se, por fim, a ditosa atividade do bem, que necessita do estímulo da esperança e do incentivo da fé.
Também nós, pouco mais pouco menos, temos passado por essas fases do espírito, por estes Silas e Caríbdes da dúvida e do temor.
Por isso mesmo, e porque temos experimentado as suaves doçuras que penetram na alma com as doutrinas que o Espiritismo professa, chamamos para nós os enfermos, os que carregam a cruz do infortúnio, os que correm desorientados em busca das verdades psicológicas, as frágeis barquinhas humanas que se sentem impotentes para resistir aos temporais da vida.
Mas, a fim de que os que queiram vir, saibam de antemão e com ciência certa para onde vão, expor-lhe-se-mos, com precisão, o nosso credo, que não teme a luz, mas que, pelo contrário, a procura e deseja.
Talvez em breve todos os espíritas se vejam na necessidade de fazer outro tanto, para desmascararem os falsos crentes, que se cobrem de aparências com o intuito de semear a discórdia, a cizânia, e minar o puro Cristianismo que ora se levanta sobre as ruínas do cristianismo dos papas.
Eis a expressão da nossa fé:
Cremos em Deus, único onipotente, consciente, infinito em perfeição, causa do Universo. Cremos na existência e imortalidade da alma espiritual, e em sua perfectibilidade progressiva pelos merecimentos.
Cremos nas recompensas e expiações dos Espíritos, em justíssima proporção com a bondade ou a maldade de seus atos livremente realizados.
Cremos na pluralidade de mundos habitados e na pluralidade de existências, como expressão, a primeira, da sabedoria de Deus, e como meio, a segunda, de purificação das almas e de reparação das faltas cometidas.
Cremos na salvação final de todo o gênero humano.
Cremos na divindade da missão de Jesus Cristo e na redenção dos homens pelo cumprimento dos preceitos evangélicos.
Nossa moral é a caridade; nossa religião, o Evangelho — nosso mestre, Jesus Cristo. Cremos, com Jesus, que toda a lei e os profetas se reduzem ao amor de Deus e ao amor de nossos semelhantes.
Cremos, finalmente, na comunicação espiritual, necessária ao progresso da Humanidade, e prova da soberana Providência, que vela incessantemente pela fraqueza dos homens.
(37) Lucas, 9: 56.
(38) II Pedro, 3: 13.
Publicado na página https://www.luzespirita.org.br/leitura/pdf/l99.pdf