artigo da semana

-CONCLUSÃO-

Por José Amigó e Pellícer

Uma colaboração de Estênio Negreiros (estenio.gomesnegreiros57@gmail.com)

 

 

Há pouco mais de um ano, corriam tristes os dias para nós e a alma não vislumbrava no horizonte um só raio de luz, uma só esperança de consolo. Os nossos olhos viam o Sol, mas o Sol não alegrava o nosso coração; percebíamos o fulgor das estrelas, porém elas nos pareciam lâmpadas acesas por uma grande mão oculta a fim de alumiar imenso sudário, o sudário de toda a Humanidade; ao redor de nós a Natureza ostentava as suas galas, e a Criação apresentava as suas harmonias, mas essas galas e essas harmonias feriam os olhos do nosso espírito como ilusões ópticas, como sonhos passageiros de felicidade, como promessas sedutoras que nunca teriam cumprimento. Como o condenado à morte, que se vê rodeado de todos os meios e elementos de vida nos melhores anos da sua juventude, como aquele que se vê junto a uma família querida, de cujo seio a ingrata morte o arrebata, e para o qual tudo é obscuro e aterrador; assim, nós, receando perder de um momento para o outro, e talvez para sempre, as riquezas e doçuras da vida do Espírito, só podíamos considerar, com desalento, as belezas e as harmonias que Deus derramou pelo Universo, a fim de alegrar e esperançar os homens.

 

Os nossos corações estavam então enfermos. Uns, dentro das crenças romanas, sentiam as dúvidas apoderarem-se do seu ânimo, sempre que o entendimento, procurando descobrir a verdade, invadia os términos da filosofia racional e passava por cima da linha estabelecida, como um cordão sanitário, pelos fariseus do catolicismo exclusivista; outros, indiferentes às matérias religiosas, em consequência dos desenganos colhidos nas excursões ao redor do catolicismo oficial, sentiam, nas horas de recolhimento e estudo, uma necessidade imperiosa de recuperar a paz da alma, que haviam perdido com as esperanças da fé; finalmente, os materialistas, apesar de poucos, se agitam impotentes com a vertigem do desespero em um vácuo que não podia ser preenchido pelos ensinos absurdos de uma religião mal interpretada e que, apesar de pretender o monopólio da verdade, estava em luta com as descobertas da Ciência e com os mais nobres sentimentos que brotam de um coração puro e generoso. Todos lutávamos, todos desejávamos rasgar o véu do futuro; todos buscávamos um oásis consolador de verdade e de esperança no deserto da dúvida e do desalento em que se esgotavam as nossas forças.

 

Isso se dava há pouco mais de um ano. Desde então tudo mudou ao redor de nós. Hoje, o Sol nos parece belo, belos os astros que brilham na escuridão da noite, belas as galas da Natureza e as harmonias do céu, bela a vida e bela a Criação. Um doce orvalho, o orvalho da fé, vivificou a nossa alma e o amor enche o nosso coração. Amamos a vida, porque é um dom da bondade infinita, e amamos a morte, porque sabemos ser o começo de outra vida mais feliz. Somos ditosos no meio das misérias da vida, porque o amor e a fé são na Terra as primícias da felicidade imortal. E quem foi que realizou esse milagre, quem acalmou a tempestade que rugia ameaçadora nas soledades da nossa alma, quem fez renascer em nós os doces consolos da fé e despertou todos os germens de adoração ao Ser Supremo e de amor às criaturas adormecidas em ensinos insubstanciais? Foi o Espiritismo, foi o Cristianismo de Jesus.

 

Sim, leitores e irmãos, o verdadeiro Cristianismo realizou esse milagre. Bebíamos águas lamacentas e estávamos enfermos; remontamos à torrente em busca do manancial, e as águas puras restabeleceram a nossa saúde e renovaram as forças vivas do nosso espírito. Vós, filhos do povo, pobres filhos do povo que nasceis envoltos na atmosfera insalubre do infortúnio, que viveis na obscuridade e na miséria, que trabalhais e não podeis com o vosso trabalho matar a fome dos vossos filhos, que tiritais de frio por falta de abrigo, que gemeis de febre por falta de alimento, e que desesperais pensando no vosso futuro, se chegardes à velhice, e no futuro das vossas infelizes famílias, se uma morte prematura lhes arrebatar o vosso amparo, vinde conosco, vinde para o lado dos outros filhos do povo que vos amam como irmãos, e que lamentam as vossas necessidades e amarguras. Vinde, e as vossas lágrimas se enxugarão e os vossos trabalhos se tornarão mais suportáveis, e não temereis mais pela sorte dos vossos filhos, porque recebereis inefáveis consolos para o presente e a esperança de um porvir seguro, livre das misérias e das penas que consomem as forças do vosso corpo e a atividade do vosso espírito.

 

Sabeis que sois iguais em dignidade e em direitos aos privilegiados da Terra, e sabereis igualmente que sois filhos amados do Pai celestial, que vos espera com os braços abertos para dar a recompensa que merecerdes pela vossa resignação e pelas vossas virtudes.

 

A felicidade entrará nas vossas pobres moradas e possuireis no coração um tesouro inesgotável que a sombria mão da morte não vos poderá roubar. Nós vos chamamos, porque a caridade no-lo prescreve, porque sois nossos irmãos, porque, como vós, choramos, queremos e devemos fazer-vos participantes das riquezas e da alegria que a Providência pôs em nosso caminho.

 

Também a vós nos dirigimos, ricos e poderosos da Terra, que desfrutais a consideração e as comodidades do mundo. Deus concedeu-vos os bens que negou aos outros; mas, como a Sabedoria infinita nada permite de inútil, devemos acatar e venerar as obras da sua justiça. Ele vos concedeu as honras e as riquezas; não vo-las invejamos, porque são vossas e não nossas. Sois ricos; que Deus vos abençoe. Vinde, porém, para o nosso lado, acolhei-vos à benéfica sombra do verdadeiro Cristianismo, e sereis ainda mais ricos, possuireis as riquezas da alma, cujo valor excede bastante o dos vossos cofres. Com elas comprareis os gozos da Terra, vãos e passageiros; com as outras alcançareis harmonias sublimes e imortais. O verdadeiro Cristianismo revelará o segredo do vosso presente bem-estar, vos indicará o bom uso que podeis fazer dos vossos bens, vos recordará a miséria alheia, formando um triste contraste com a abundância em que nadais; vos dirá, enfim, que não deveis consentir que os vossos irmãos sofram fome quando possuís montões de ouro; e, desse modo, administrando fielmente os bens que Deus concede, sabereis granjear a aprovação superior e tornar estável a vossa felicidade transitória.

 

Quiséramos também chamar para o Cristianismo de Jesus os ministros da Igreja Católica Romana. Com quanto amor e entusiasmo recebê-los-íamos! Eles poderiam fazer num só dia o bem que, sem o seu poderoso concurso, precisará, talvez, de um século para se realizar. E por que os não chamar? É certo que no seio das famílias, no confessionário, no púlpito, onde quer que se fale do Cristianismo espírita, só se lembram de nós para nos ridicularizar, menosprezar, caluniar, ofender e amaldiçoar, pois foram educados assim; entretanto, creem na verdade dos ensinos de Roma, e são mais dignos de compaixão que de indiferença e desprezo. Não vos desprezamos, nem odiamos; ficai sabendo de uma vez para sempre: compadecemo-nos de vós, porque, sem que o percebais, o orgulho vos cega. Oh! Quão diverso seria o vosso proceder para conosco, se soubésseis despojar-vos desse orgulho que vos encandeia e entontece, não vos deixando ver com clareza a luz do Sol!

 

Estudai imparcialmente as doutrinas do Cristianismo puro; estudai-as, como nós o fizemos, em nome de Deus, e, se tiverdes sentimento, se sentirdes caridade, se tiverdes um juízo são, sentireis como nós, amareis e julgareis como nós, resolvidos a fazer no altar da verdade o sacrifício das comodidades e considerações mundanas. Refleti que o Cristo pregou a caridade como principal das virtudes, cuidando pouco dos interesses temporais, e procedei do mesmo modo; do contrário, ultrajando-nos e combatendo-nos por causa da nossa doutrina, que é a doutrina da caridade cristã, teremos o direito de suspeitar que não defendeis a Religião que é o essencial, mas sim outra ordem de interesses menos santos e um tanto mais vulneráveis, que não queremos nomear para não vos fazer corar. Finalmente, quer venhais ou não, quer sacudais ou não a lepra do orgulho, o movimento universal está iniciado e há de consumar-se apesar das vossas resistências, porque vem impelido e dirigido pelos Espíritos de Deus. A paz seja com todos.

 

Do livro Roma e o Evangelho, distribuição do Portal Luz Espírita (http://www.luzespirita.org.br)